20 de nov. de 2011

O despertar do ilusionista


Eu sou o abraço de dois inimigos,

um barman de sentidos distintos,

água e óleo num liquidificador.

Felizmente, não me misturo comigo mesmo,

nunca fui da minha laia.


Sinto que tudo que faço na vida

é acidentalmente derramar venenos

e buscar meus próprios antídotos.


É como se eu estivesse embriagado por um sonho constante

que insiste em virar pesadelo quando pisco os olhos.

Cansado de driblar meus demônios faço amor com eles,

mas mando as flores para os anjos desapontados.


Minha essência não combina com a minha fama.

Perdi na inércia cafajeste popstar

grande parte das minhas paixões

e afugentei inúmeros bons amigos.


Minhas ideias esquizofrênicas ferem como espinhos de rosas

e a minha crueldade não passa de uma espada de madeira na mão de criança

ou acerta no saco, ou não faz efeito.


Eu tenho repulsa pelo cinza.

Em mim cabe o par e o ímpar,

o quente e o frio.

De morninho me basta o achocolatado.

Cansei de queimar a língua ou gelar a garganta.


É um beliscão na alma quando me dizem:

-Fê, você esfrega na cara os mistérios que decifra com facilidade,

mas se desintegra porque não saber ver o óbvio.

E hoje, o que é o óbvio, senão algo que todo mundo sabe menos eu.


Essa esteira rolante me fazia pensar:

“Eu não! Deus me livre, eu prefiro ser louco e tatear às cegas,

subir uma escada que faltem degraus,

fazer gambiarras com brio”.


Acreditava nisso porque criei meu próprio mundo

e sabia repovoar e substituir pessoas como ninguém.

Mas sinto falta de você que me foi insubstituível.


Percebi que minha vida é composta somente por vocês e todos os dias que me roubaram a rotina.

O costume para mim é uma agenda de papel rabiscada.

Afinal acordo morrendo de sono

e durmo morrendo de pressa.

Amanha quero viver de novo.


Lugares sozinhos não me marcam, não quero ir para Passárgada.

São os momentos que me esculpem a memória.

De abismos em abismos nem mesmo lembro por qual estrada vim,

Sei que vim a saltos curtos, de poema em poema,

de paixão em paixão.

E continuo a procura de mim mesmo.


Conto histórias sobre quem eu sou

para as cabeças que parecem com a minha

porém, essas palavras iludem, porque deixei de ser eu mesmo

quando resolvi ser outro alguém,

que agora infelizmente também sou eu.


Não é preciso contar nada quando simplesmente se é.

Era pra ser um relato não uma fábula.


Reconheço facilmente meu melhor eu.

Sofro de dupla personalidade, mas sei separar o joio do trigo.

Dos meus heterônimos tenho um herói e um vilão.


Quando fico sem viver

(sem fazer a coisas que me inspiram)

Fico sem escrever

pois só ponho no papel o que vale a pena

E meus dias com vocês, que são a razão irracional dessas linhas, é o que me vale.


O dia que eu for contar para os meus netos a minha história

não quero que vocês sejam fantasmas.

Não quero tornar crianças alegres em vítimas de mais uma de minha ilusões,

quero que seja o final feliz de um passe de mágica

que tudo deu certo e o que era incerto voltou a ser tangível.


No final das contas sou tão eu quanto você.

Sou tão vidro quanto grão de areia

Por ser tudo serei nada

e do nada o infinito...


Felipe Castilho. São Paulo 20/11/2011


6 de nov. de 2011

Ai de mim se fosse sonambulo!

Não lembro mesmo de ontem

Talvez, nem do resto da minha vida

Mas acordei sozinho

com uma poesia me fazendo cafuné

fez amor comigo a noite toda

me vigiou da cabeceira

enquanto eu jazia embriagado


A soma de todas as luzes


Gosto da cor branca

Da folha intacta que aceita todas as ideias

Da teia de aranha sutil em arte e arquitetura

Do mármore virgem que pode assumir todas as formas

Dos fones do meu ipod que me injetam musica


Sabe quando a lágrima fica pendurada na ponta do nariz

Ela não cai porque é artista de circo


Me atiça a cor branca

Dos fantasmas sábios e suas correntes

Do medroso que precisa da sua mao para segurar

Do vestido da noiva que consola o cafajeste


Me conforta a cor branca

Da nuvem leve que desenha ursinhos

Da gaivota que sobrevoa a nossa calma

Do algodão que é nossa flor favorita sem saber

Da espuma do mar, nossa massagem com dedos de natureza


Me estufa o peito

Me sacode de lado

E me poe para ninar

Mesmo que amanha eu não acorde

Mas saiba exatamente o que fazer dormindo

Porque Felipe

Você sabe

Que de hoje em diante

Quando a cor branca te chamar

Nada de sono gostoso


Acorde da burrada que faz a 25 anos

A cor é floco de neve

Que o frio te esfrega na cara

Que te arrasta na veia

Porque só o branco da pele dela

Sussurra ainda que sem voz

A paz que te ilude



Felipe Castilho, 06 de novembro de 2011.

2 de nov. de 2011

Gênesis

Quando aprendi a mergulhar fiquei encantado no primeiro dia com os peixes imensos, com as arraias e com os tubarões. No segundo dia me dei conta das anêmonas e como nadavam certos cardumes. O que demorei mais para perceber foram os minúsculos peixes hipercoloridos e algumas conchas miúdas de cores vibrantes e formações magníficas do tamanho de uma unha.

Conhecer pessoas é como mergulhar. Primeiro o que nos chama a atenção são as características impactantes e com o tempo passamos a descobrir o tesouro dentro de cada uma delas.

Adoro conhecer gente nova, enxergar bem as pessoas, como são suas ideias e suas características mais visíveis.

Vejo em você arte, literatura, conto de fadas, uma boa prosa, poesia e inteligência. Vi também a minha paixão adormecida por escrever - e foi o suficiente para eu entender tudo o que eu preciso saber, pelo menos por enquanto. As palavras enfim despertaram de um sono profundo, me beijaram dando bom dia, depois de me roubarem a noite.

Como é possível hibernar acordado? Foi um hibernar artístico. De uma primavera até a outra, de ponta a ponta, fui o urso literal. Você talvez, bela adormecida?

Disseram-te certa vez “Escrevi enquanto dormia, pois acordado era apaixonado por você”. Às vezes acho que faço parecido, escrevo durante as conversas, durante os momentos mágicos, e quando estou só, com a folha e nada mais, apenas passo a limpo.

Levo a metáfora do mergulho adiante, gosto de surfar pessoas, tem gente que pra mim são surf, entende? Movimento e exercício na superfície são como beijos de balada, fogos de palha... Mas me encanto e me tira do trilho quem me descola do real, do banal, da superfície, quem me faz mergulhar e interagir com meus sonhos...

“Os sonhos nos atormentam porque misturam o real com o irreal. Estão cheios de personagens reais, e quase sempre tratam de situações reais, mas eles são deliciosamente irracionais, forçando realidades a extremos de delírio. Se tudo num sonho fosse realístico, ele não teria nenhum poder sobre nós; se tudo fosse irreal, nós nos sentiríamos menos envolvidos nos seus prazeres e temores. A fusão das duas coisas é o que o faz assombroso.”

Concordo com o Robert Greene, é assombroso tanto quanto você ser humana e me parecer personagem de livro. Talvez tenhamos uma história a ser escrita, talvez não. Talvez eu já a tenha escrito em todas as entrelinhas de antigos poemas, textos, amores ou rabiscos de guardanapos. Talvez tudo até hoje fosse só rascunhos... Para passar a limpo a história da vida é preciso achar os verdadeiros protagonistas.

Durante a dúvida entre rascunho ou obra-prima vamos mergulhar?


Felipe Castilho, 19 de outubro 2011.

23 de mai. de 2011

Sempre por aqui e nunca dito.

Ouvi recentemente de Eduardo Galeano: “O mundo não é feito de átomos o mundo é feito de histórias. Porque são as histórias que a gente conta, que a gente escuta, multiplica, recria, as histórias são as que permitem transformar o passado em presente. E que, também permitem, transformar o distante em próximo, possível e visível. O mundo é um tecido de encontros e desencontros, de perdas e ganhos e o melhor de meus dias é o que eu ainda não vivi. E cada perda corresponde a um encontro que ainda não tive. E por sorte a realidade é generosa e não falha nisso, na verdade escrevo para celebrá-la.”
Talvez isso tenha me feito escrever as seguintes linhas, que sempre estiveram nas entrelinhas do que me faz sorrir ou sofrer.

Sempre por aqui e nunca dito.


Quando eu estou perto de você
me sinto singelamente vulnerável.
Volto a ser criança,
ou talvez o tímido pré-adolescente sonhador.
Passo a ver o mundo através de olhos inocentes,
mas que parecem ser capazes de enxergar muito além.
Eu me encanto com cada detalhe,
presto atenção a cada palavra,
e aprecio cada esboço de sorriso.
Como na fusão de um sonho com o mundo real
eu vejo valor e beleza em tudo.
O compasso da Terra entra em harmonia,
o caos dá lugar à mais bela sincronia de acontecimentos.

Engraçado ou trágico, embora eu tenha sempre vontade de escrever a nossa história,
nunca consegui formar as frases.
Não tenho dúvidas de que transbordei pelo mundo essa alegria,
e contei-a por todos os meus poros milhares de vezes,
ou talvez por olhares (brilhantes como o fogo).
Desculpe-me os clichês, as palavras de sertanejo universitário,
mas quero ser simples como as cartinhas do tempo de colégio.
Até porque, quero ser verdadeiro e dizer as palavras certas
em vez daquelas que impressionam.
Eu de fato não sei explicar a conexão que sinto
como se em sua companhia eu fosse parte de algo maior,
de uma missão mais nobre.

Você ilumina as pessoas ao seu redor
e se alguma vez tentei parecer importante ao falar-lhe
é porque acredito que você é incrível
e a vendo nas nuvens,
tentei construir (por engano) uma escada de impressões
para chegar até você, que na verdade estava bem ao meu lado.
E por que justo com você?
Por que justo com quem a sintonia falava por si mesma, e tornavam as palavras quase inúteis?
Por que justo com você eu fui agir assim?
Porque os grandes amores nos viram do avesso,
nos levam à loucura e à idolatria,
mas nos trazem de volta.

E agora, dentro de mim mesmo,
quero pensar nos encontros que nunca tive,
nas palavras que nunca ouvi, nas histórias que ainda não fiz parte,
nos mistérios que deixei de pensar por estar absorto em nostalgia.
Hoje dou um passo à diante,
mas limito-me a dizer que amo esse conto de fadas.

Felipe Castilho
São Paulo 23/05/2011